quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

1º CRÍTICA AO TEATRO FÚRIA E OS INSURRETOS FURIOSOS - EDUARDO FERREIRA


Muito bem, Insurretos. Chega deste ano. Só ano que vem agora. E como matéria derradeira deste ano quase finado em que o Teatro Fúria completou sua primeira década, publicamos aqui uma crítica do libertário Eduardo Ferreira, publicada no Overmundo.
Euforia, Eufuria, Fúria-Fúria-Fúria!!! Vida longa, motivada e tesuda a todos os Insurretos Furiosos Desgovernados e companheiros de luta!

"Com uma vontade obstinada de fazer teatro sob o sol do cerrado brasileiro, grupo está fazendo uma revolução nos palcos matogrossenses Quando me convidam para ir ao teatro assistir a uma peça sempre fico meio desconfiado e sempre me recordo de uma camiseta do pessoal do Casseta com a seguinte inscrição: Vá ao teatro, mas não me chame! Maldade pura, mas o teatro é uma arte a que raramente assisto, acho quase tudo muito chato. Mas quando vi o Teatro Fúria pela primeira vez fiquei absolutamente extasiado com o tipo de teatro que estavam realizando. Não imaginava que estivessem fazendo um trabalho tão maduro, competente, profissional mesmo, com bom texto, boa direção e principalmente atores locais sem nenhum ranço de amadorismo. É uma arte muito difícil, que requer muito trabalho e muita preparação de ator, muita técnica, coisa complicada nesses lados de cá. O teatro matogrossense parece agora se elevar para outras esferas, outros palcos. Arte de celebração e comunhão com divindades. Uma referência de qualidade teatral autoral que me recordo produzida em Mato Grosso foi a montagem de O capote, de Gogol, realizada pelo Grupo de Risco, liderado por Chico Amorim, nos idos anos 80. Teatro ousado, inventivo, experimental, com soluções inteligentíssimas que o Chico foi buscar nos gregos, nas ruas, nos quadrinhos, na cultura popular. Depois disso só consegui me extasiar com os 'furiosos' quando assisti à peça Nepal, de autoria própria e primeira montagem do grupo. Formado por, Giovanni Araújo, Bruna Menesello, Caio Matoso, Rodrigo Toledo e Péricles Anarcos, o Fúria, que em sua formação original tinha Eduardo Espíndola, nasceu há sete anos com a determinação de fazer do teatro um modo de vida, estabelecendo uma relação visceral, orgânica, definitiva. Giovanni era vendedor de medicamentos, Eduardo funcionário de um laboratório de análises, Péricles trabalhava com o pai, que o controlava pela disposição anárquica e Toledo, desempregado, também era infernizado pelos pais para que largasse mão do teatro e se dedicasse aos estudos. Inventava mil histórias para poder ensaiar, até o dia em que venceu seus medos e encarou a mãe decidido a tudo. Está até hoje na ativa. Furioso e vencedor. Interessante a postura do grupo onde todos fazem de tudo, como dizem: "É uma trupe multifacetada, multidisciplinar, com uma vontade obstinada de fazer teatro sob o sol do cerrado brasileiro". Dividem tarefas, cumplicidade e confiança. Todos são atores, diretores, autores, produtores, iluminadores e cenógrafos. Depois de Nepal, que abordava o apocalipse, com o encontro dos dois últimos sobreviventes da Terra condenados à morte que se sentem no dever de reinventar uma nova convenção social. Experimental, inventiva, crítica, a montagem revelava uma lucidez que inaugurava um novo modo de fazer teatro em Cuiabá. Cenário mínimo, texto certeiro, direção segura, bons atores, algo de novo surgia no cenário matogrossense. De lá para cá já foram sete peças montadas, mais de 700 apresentações em mais de 50 cidades de 20 estados brasileiros, participações destacadas nos festivais, de
Curitiba (2001), Londrina (2001 e 2004), Rio Cena Contemporânea (2004), projeto Palco Giratório do SESC Nacional (2003) e Caravana Funarte (2005). O Fúria atingiu, seguramente, uma maturidade estética singular e tem potencial para se consolidar como presença e referência do que há de melhor nas artes cênicas nas regiões Centro-Oeste e Norte do Brasil. Eles desenvolvem também alguns projetos de oficinas, acreditam que é possível formar cidadãos através do teatro, ou mesmo, formar técnicos e artistas para trabalharem com o teatro. Estão adaptando o espaço físico de uma casa bastante grande, onde trabalham hoje, para transformá-la em um Centro Cultural, com teatro de bolso, arena, salas para oficinas e uma biblioteca básica, com acervo direcionado para o teatro. O Fúria ampliou suas ações e produziu em 2006, o primeiro Festival Nacional de Teatro de Cuiabá, o evento aconteceu em julho. Invadiram ruas, espaços não convencionais, salas de teatro, criaram uma efervescência para agitar a cena local. A idéia é consolidar o Festival que foi um sucesso em seu primeiro ano de realização. Certos trabalhos nos fazem repensar as relações que travamos com a vida. É possível fazer teatro com qualidade estética e autoral em Cuiabá. Os caras estão mostrando isso com muita determinação e dignidade. Já posso ir ao teatro com a certeza de que, como disse o poeta: "Tudo vale a pena quando a alma não é pequena." "

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