domingo, 22 de março de 2009

4º - CRÍTICA AO TEATRO FÚRIA E OS INSURRETOS FURIOSOS - JÚLIO CUSTÓDIO


"Gostaria de mais referências. No que há interseção com outras artes, que tenho certa familiaridade, talvez possa me expressar mais coerentemente, mas naquilo que é teatro puro, se existe tal coisa, não terei muitos meios de me defender além do público burro. Com esse alerta, o choque. Sábado me fascinei. O Fúria há tempos me atraía indiretamente. Na boca de certas pessoas, a palavra ¿profissionalismo¿ soa algo felizmente como competência e boa arte, tal como eu os entendo. Essas pessoas me diziam isso sobre o Fúria. Me senti livre, então, para elevar minha expectativa no ápice do meu contexto

No que refere à arte, expectativa alta superada é algo raro em Cuiabá. O Fúria fez. É uma pena ter sido meu primeiro deles. É uma felicidade ter sentado na primeira fila do sábado. Entendi, logo nos primeiros minutos, a razão do teatro nunca ter sido considerado muito por mim. Era claro, e óbvio: eu nunca tinha assistido uma boa peça. Como é reconfortante uma obra preocupada nos detalhes! Estavam ali, cada ser fora do que é, e realmente sendo essa ausência. As mesas, o livro, a sujeira... os atores. Respeito à linguagem escolhida. Presentes, apresentação do tema, legitimação de um passado na história, a convivência dos personagens, a vida da trama, caos e fim. Os diálogos, algo com o qual fico sempre apreensivo em livros e filmes, estavam como e onde deveriam estar, em função da trama, dos personagens, e de nada mais.

Havia um defeito sim, e seu eu estivesse mais acostumado com outros nível-Fúria talvez considerasse agora como um problema grave. Falando em arte pura, a tese final do roteiro, aquilo que se pode tirar de fábula, o objeto ironizado e a própria ironia, no caso, a deliberação e a aquela justiça, não me apresentou e nem me apontou para nada novo. Dirão alguns, desde quando apontar é papel da arte? Ainda mais, precisamente, da arte pura? Mas, pensem sem ciúmes, desde quando a arte pura não aponta coisa alguma? Há mesmo alguma manifestação artística que não aponta? Algum artista que se esconde, logo em sua arte?

Foi esse o único não-preencher-me da noite. Mas não, de maneira alguma, isso não diminuiu o superar a expectativa. A arte do Fúria é um exemplo para todos os artistas de Cuiabá. É prazeroso encontrar uma boa relação entre pretensão e capacidade. De tudo ali, há algo que me seduziu muito destacadamente: Plínio! Atriz e personagem se conheciam muito bem, não havia conflito entre eles. Bruna e Plínio foram um eterno ponto alto na peça. Uma constância assustadora. Levaria sozinha, e com naturalidade, o espetáculo em suas costas, se acaso o conjunto todo não fosse tão competente e desandasse por algum motivo. Saudosa. Ela e toda a peça. Parabéns ao Fúria, sinceros. Esperamos ansiosos mais, e pela maravilha obtida, esperaremos, sempre, ainda melhor."

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